Trecho da matéria publicada na edição 203 do Boletim de Leitura Orientada (Bolo), do projeto Ler e Pensar.
A professora Gleice Lara Esperanceta da Escola Municipal Rui Valdir Pereira Kern, de Quatro Barras, está no Ler e Pensar desde 2010, mas ainda não havia inserido o jornal Gazeta do Povo em suas aulas no Centro de Atendimento Especializado (CAES) na Área de Surdez. Era difícil vislumbrar a eficácia do recurso, já que a leitura e a escrita em Português são as principais dificuldades dos alunos surdos. No entanto, no ano passado, Gleice resolveu tentar e levou o jornal para complementar o projeto de cidadania que estava desenvolvendo com seus 10 alunos do CAES.
A primeira experiência foi com imagens das notícias e charges. Depois, inseriu os classificados e as manchetes. “Eles se interessaram muito. Começaram a relacionar o que viam na televisão às notícias do jornal e queriam aprofundar mais”, conta Gleice. Foi aí que ela inseriu a leitura das matérias e deu início a uma verdadeira transformação na vida dos alunos e na comunidade local.
Para trabalhar as reportagens, a professora seguia três etapas: leitura em Libras, depois em Português e, na sequência, pedia a reescrita do texto. “Só a leitura não era suficiente para a compreensão, por isso a explicação em Libras. Já a reescrita foi importante para que eles assimilassem a gramática”, explicou Gleice.
Despertando cidadãos
A dedicação possibilitou uma melhor compreensão das notícias, tanto que os alunos começaram a questionar assuntos principalmente sobre direitos e deveres dos cidadãos. “Eles queriam saber dos próprios direitos enquanto surdos. Iniciamos pesquisas e vimos que a Lei Federal nº 10.436, que prevê intérpretes nas escolas e órgãos públicos e a inclusão da disciplina de Libras no currículo escolar, não estava sendo cumprida”, explica Gleice.
Quando souberam disso, não houve dúvida: queriam reivindicar os direitos e descobriram como pela reportagem Qual lei você quer que exista? Pode sugerir, de 17/6/2013. A notícia explicava como a população podia sugerir leis. Os alunos seguiram as orientações e montaram um manifesto para solicitar a criação de uma lei municipal que incluísse a disciplina de Libras na grade escolar. Colheram assinaturas com a comunidade e depois de terem as 700 exigidas pela lei, protocolaram o pedido na Câmara. O projeto foi votado, aprovado e sancionado em agosto. Em paralelo, ainda construíram um blog e um jornal com notícias sobre as atividades do CAES. “O trabalho com alunos surdos exige mais do professor, mas cada minuto compensa quando você acompanha a evolução”, conclui Gleice.